Sabemos que evangelho
significa Boa nova ou Boa Notícia, por isso quando deparamos com um
dos sinóticos, no caso São Mateus, nesse Domingo de Ramos, é
forçoso nos perguntar, como que os pormenores da paixão de Jesus, a
sua morte na cruz, poderá nos trazer uma mensagem de Boa Nova... E
mais um detalhe importante, se é Domingo de Ramos, que tem como foco
a entrada triunfal de Jesus na cidade Santa, como vemos na primeira
proclamação, feita antes da procissão de ramos, novamente nos
perguntamos, o que poderá haver de triunfal em um acontecimento que
irá resultar em uma tragédia?
Sendo o evangelho a Palavra
de Deus revelada sob inspiração do Espírito Santo, é necessário
abrir o coração para compreendê-lo, e não só a razão.
Naturalmente essas questões que a nossa razão apresenta entre
outras, longe de manifestar a nossa incredulidade, nos ajuda a
migrarmos para o coração, pois, se dermos relevada importância ao
fato histórico em si, a comoção que iremos sentir diante desses
relatos, será idêntica á que experimentamos diante da obra de um
grande taumaturgo.
Vamos acabar chorando
comovidos, com toda a maldade que fizeram com o Jesus Histórico e
jamais conseguiremos entender o que isso tem a ver com a nossa vida.
Diante de um evangelho, precisamos sempre ter em mente que se trata
de uma reflexão sobre Jesus de Nazaré, feita pelas primeiras
comunidades, estamos portanto longe do fato histórico da condenação
e morte do Senhor, sobre o qual nenhum resquício chegou até nós, a
não ser os evangelhos, que nada mais são do que escritos coletados
pelas comunidades e que por isso mesmo requer uma interpretação
usando sempre como referência a Tradição e o Magistério da
Igreja, que se fundamenta no testemunho dos apóstolos e das
primeiras comunidades, como a de Mateus, onde havia muitos judeus
convertidos, e já se tinha consciência de que Jesus ressuscitara, e
que agora tentam descobrir qual a relação desse Jesus ressuscitado
, com aquele Homem Jesus de Nazaré, que foi condenado com 33 anos, e
passou por uma morte tão vergonhosa e humilhante.
Sabemos pelo próprio
relato, qual foi a atitude da comunidade diante de tal revelação,
não guardaram dúvidas ou desconfianças diante da Revelação
Divina e concluíram com um belíssimo ato de Fé, que Mateus
retratou com fidelidade na exclamação do Oficial Romano “Ele era
mesmo o Filho de Deus”!
O evangelista Mateus,
preocupado em convencer seus conterrâneos sobre a Verdade de Jesus
de Nazaré, usou de uma estratégia ao reler as escrituras, apontando
de maneira caridosa e paciente, os textos que a ele se referiam
facilitando assim a compreensão sobre o conteúdo das leituras desse
Domingo de Ramos, que nos introduzem na Semana Santa, onde se celebra
o Tríduo Pascal, enfocando a Vida e a morte, a plena realização e
o fracasso, as trevas e a Luz, antagonismos presentes não só na
Vida Terrena de Jesus, mas na vida de cada Ser Humano, que a partir
de então poderá fazer suas escolhas e decidir-se por uma ou por
outra, pois Salvação é exatamente isso, conhecer a Verdadeira Luz,
a Vida e a Verdade Absoluta que é o próprio Cristo, e deixar-se
atrair por ele tomando a decisão de segui-lo, não mais a partir de
uma obrigatoriedade Legal de Caráter Religioso, mas a partir de uma
experiência real como ocorreu com as Comunidades de Matheus, e o
Oficial Romano, sendo este precisamente o convite e o apelo desse
evangelho: que as nossas comunidades revejam toda a caminhada e em
uma auto afirmação da nossa Fé, redescubramos: Jesus é o nosso
Senhor, o Filho de Deus!
O máximo que se pensou
sobre Jesus, é que ele fosse um Profeta, tal qual nos atesta a
conclusão do relato da sua entrada em Jerusalém, Mateus não engana
seus leitores, pois sendo um Profeta renomado, terá o mesmo destino
dos demais, sendo ouvido por poucos, rejeitado por muitos, e
finalmente esmagado com a morte. Portanto, aquilo que parece ser um
momento de glória, pelo menos na visão nacionalista da Nação de
Israel, irá redundar em terrível fracasso! Há Glória sim,
presente no regozijo de um Homem totalmente novo, Fiel, que com sua
encarnação Divinizou a todos e a cada um dos homens, resgatando
neles a imagem e semelhança do Deus Criador. Um homem capaz de ter
toda firmeza e confiança em Deus,, mesmo diante das contrariedades e
provações, em um contexto que caminha para o iminente fracasso,
como esse Servo de Iahweh, assumido pelo Profeta Isaias.e que nessa
circunstância provoca a queixa orante do Salmista “Meu Deus, Meu
Deus, por que me abandonastes”
O apóstolo Paulo, na carta
aos Filipenses, consegue resumir, de modo magistral, o que Mateus
transmite nas entre linhas desse evangelho... O mal presente no
coração do homem, do presente, do passado e do futuro, não
conseguirá jamais subjugar o Bem Supremo, impondo-lhe o seu domínio.
Ninguém o humilhou, mas Ele humilhou-se, ninguém o entregou á
morte, mas Ele próprio entregou-se, ninguém foi capaz de rebaixá-lo
despojando-o da sua Dignidade de Filho de Deus, Ele próprio
rebaixou-se e esvaziou-se de si mesmo.
Podemos então concluir a
nossa reflexão desse domingo de Ramos, olhando para o testemunho do
Oficial Romano, homem considerado impuro e, portanto, descartado da
Salvação pela Religião Oficial, mas que fez a sua experiência com
Cristo, e mesmo sem pertencer ao Povo da Promessa, reconheceu Nele
aquilo que os Doutores em Escritura não reconheceram. O Oficial viu
a revelação do Amor de Deus, naquele Homem que se entregou
livremente, porque o verdadeiro amor não é aquele que domina, mas
aquele que se deixa dominar, o verdadeiro amor pressupõe uma entrega
total, dentro de uma também total liberdade. O verdadeiro amor se
aniquila e se deixa esmagar, tornando-se alicerce na construção de
algo totalmente novo, que o coração humano busca e sonha, mas que
só se consegue encontrar em Jesus, alguém como nós, mas que
vislumbrado na Fé, o descobrimos como nosso único Deus e Senhor,
Aquele que o Pai exaltou para sempre!