quarta-feira, 23 de maio de 2012

São Paulo e o Espirito Santo


Em todo o corpo da obra paulina, é vasta a abordagem e a atenção que o Apóstolo dedica ao Espírito Santo. Nesta pequena reflexão, destacaremos apenas alguns aspectos.
Em suas Cartas, São Paulo apresenta o Espírito Santo na sua ação, como princípio de santificação que atua no espírito humano, permitindo um novo conhecimento e uma vida nova. São Paulo não apresenta, porém, somente a ação do Espírito, mas comunica-nos também algo da natureza da terceira Pessoa da Santíssima Trindade. Paulo reflete sobre o Espírito expondo a sua influência não só no agir do cristão, mas também no seu ser. De fato, ele diz que o Espírito de Deus habita em nós (cf. Rm 8, 9; 1 Cor 3, 16) e que “Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho” (Gl 4, 6). O Espírito não é uma força anônima, mas tem sua natureza precisa de ser a presença em nós do próprio Deus Pai e de Seu Filho.

O Espírito, princípio do conhecimento
O Espírito é o princípio do conhecimento e, portanto, da experiência de Deus. O Espírito torna possível um conhecimento novo da realidade porque Ele invade todo o processo da percepção do significado das coisas e da comunicação da sabedoria. O Espírito é aquele que nos conduz ao Mistério mais profundo da realidade, ao Mistério de tudo.
O conhecimento que o Espírito dá não é puramente teórico, mas existencial. No Novo Testamento, o pneuma é comparado ao vento (cf. Jo 3, 8 e 20, 2), a uma força (cf. At 1, 8), a “um ruído como o agitar-se de um vendaval impetuoso” e ao fogo (cf. At 2, 3). Para Paulo, o Espírito é, sobretudo, o “Espírito que dá a vida” (1Cor 15, 45).
O Espírito está intimamente ligado à experiência e todo o seu trabalho missionário foi marcado “pela força de sinais e prodígios, na força do Espírito de Deus” (Rm 15, 19). A ação do Espírito é descrita como um “derramar” (Rm 5, 5), “irrigar e abeberar” (1 Cor 12, 13ss). Pelo dom do Espírito, os filhos clamam “Abbá! Pai!” (Rm 8, 15). O evangelho é recebido “com a alegria do Espírito Santo” (1 Ts 1, 6). A conversão é uma visão nova da realidade, como se fosse a retirada de um véu (cf. 2 Cor 3, 12-16). Sem contar com a profunda mudança moral produzida pelo “vestir-se do Senhor Jesus Cisto” (Rm 13, 13-14) e pelo “fazer morrer as obras da carne pelo Espírito” (Rm 8, 13).
Tendo recebido esse Espírito, podemos conhecer os dons de Deus e comunicá-los não por meio de palavras ditadas pela sabedoria humana, mas com palavras ensinadas pelo próprio Espírito. Esse Mistério permanece inacessível para a sabedoria deste século, que considera a experiência da fé uma loucura.
A primeira parte da Epístola aos Coríntios trata dessa dialética entre sabedoria de Deus e sabedoria do mundo. No segundo capítulo, em sintonia com a lógica do agir paradoxal de Deus, que revela a sua potência e sabedoria na impotência e loucura da Cruz de Cristo, Paulo afirma que escolheu anunciar o Mistério de Deus em Corinto sem recorrer à arte da retórica. Ele insiste sobre a “demonstração de Espírito e de potência” para que a fé dos coríntios se fundasse não “sobre a sabedoria de homens, mas sobre a potência de Deus” (1 Cor 2, 4-5). A sabedoria de Deus coincide com o seu desígnio de salvação que ficou escondido, envolvido no mistério antes da sua revelação em favor daqueles que creem.
Essa revelação não pode ser conhecida por aqueles que se deixam guiar por critérios mundanos que o Apóstolo chama os “chefes deste mundo”. Todos esses permanecem estranhos à lógica do agir de Deus que ressuscitou Jesus crucificado, constituindo-o Senhor na Glória (1 Cor 2, 6-8). São Paulo afirma que se pode falar dessa realidade somente por meio da linguagem ensinada pelo Espírito de Deus entre aqueles que são espirituais (cf. 1 Cor 3, 1-3).
A distinção entre o homem psíquico e o homem espiritual indica os dois tipos possíveis de conhecimento da realidade: o simples conhecimento natural, baseado na sabedoria humana e o verdadeiro conhecimento, que é baseado no dom do Espírito. No conhecimento natural, a pessoa permanece na superfície da realidade; é ferida pelas coisas, mas lhe escapa o seu verdadeiro significado; no conhecimento espiritual, o ponto de referência é sempre a realidade, entendida como mistério, como sinal de uma presença mais profunda que lhe oferece seu significado pleno. Sem o dom do Espírito, não se conhece a realidade e não se possui a verdadeira sabedoria. O Espírito de Deus, com o seu poder, é a fonte da verdadeira sabedoria.
Paulo proclama a “sabedoria de Deus, misteriosa e oculta, que Deus, antes dos séculos, de antemão, destinou para a nossa glória” (1 Cor 2, 7). Misteriosa não significa enigmática, mas sabedoria baseada no mistério, que é o desígnio admirável de Deus sobre a história. O homem natural psíquico não conhece a realidade; o Espírito é o princípio do conhecimento das coisas no seu significado verdadeiro: “A nós, porém, Deus o revelou pelo Espírito” (1 Cor 2, 10). E se o Espírito é necessário para conhecer a realidade no seu significado natural e amplo, o Espírito é indispensável para conhecer verdadeiramente quem é Cristo: “Poder de Deus e sabedoria de Deus. Pois o que é loucura de Deus é mais sábio que os homens, e o que é fraqueza de Deus é mais forte que os homens” (1 Cor 2, 24b-25). Por isso é somente o Espírito que faz dizer “Jesus é o Senhor” (1 Cor 12, 3).

O Espírito, princípio da filiação divina e da vida nova
Em Rm 8, 14, Paulo proclama o objetivo do dinamismo do Espírito: “todos os que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus”. Isso porque o Espírito é o princípio da nossa filiação divina, que se dá por meio da Morte e Ressurreição de Jesus e nos é oferecida através do Batismo. È o Espírito quem nos permite ter um relacionamento totalmente especial com Deus e invocá-lO como “Pai” (cf. Rm 8, 15). A filiação divina, de fato, supera o regime da escravidão e nos oferece uma herança perene. Para quem se deixa conduzir pelo Espírito, que gera a vida, tudo se torna possível. Assim é que se orienta a dramática luta interna no homem entre a carne e o Espírito. As forças do mal penetram profundamente no homem e na sua condição. A “carne” designa a tendência pessoal que o homem tem de resistir a Deus, o que o arrasta para a morte. O Espírito, por sua vez, produz um dinamismo oposto ao da carne, já que ele é o princípio da vida nova. A carne é o impulso ao mal e o Espírito, à vida.
Segundo Paulo, somente o Espírito é capaz de criar no homem um coração novo e libertá-lo do fardo do cumprimento de um conjunto de normas e regras. A presença ou habitação do Espírito no espírito do cristão assinala a pertença a Cristo, já neste tempo, bem como no futuro, quando Deus, por seu Espírito, ressuscitar os cristãos.
Sem o Espírito Santo, Cristo permanece um estranho; podemos falar d’Ele, discutir e até pregar o Seu Nome, mas Ele estará distante. Assim surgiram todas as grandes hipóteses sobre Jesus como um grande homem, o pregador da fraternidade, o apaixonado pela justiça, perigoso para os poderosos, o revolucionário, um comovente e dramático mito criado pelo pensamento humano. Sem o Espírito, Cristo permanece distante e desconhecido. E Paulo conclui: “quanto a nós, não recebemos o espírito do mundo, mas o Espírito que vem de Deus” (1 Cor 2, 12a); “nós, porém, temos o pensamento de Cristo” (1 Cor 2, 16b).
Por fim, um último conselho de São Paulo, para que a vida nova em Cristo dê seus frutos: “Se vivemos pelo Espírito, andemos também de acordo com o Espírito” (Gl 5, 25). A multíplice ação do Espírito desenvolve-se na vida da Igreja – e na vida de cada fiel – por meio da oração e é mais obra do próprio Espírito do que nossa.

Baseado no artigo “A Pneumatologia de Paulo”, de D. Filippo Santoro, bispo diocesano de Petrópolis, in “Coletânea, Revista de Filosofia e Teologia da Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro”, n. 13, 2008, pp. 63-83.

Você sabia?
...Que o “espinho na carne” de São Paulo (cf. 2 Cor 12, 7) pode ser o seu temperamento impetuoso? É o que considera o Pe. Mariano Weizenmann, scj, doutor em Teologia pela Universidade Gregoriana e professor da Faculdade Dehoniana, em Taubaté (SP). “A partir da concepção grega, o espinho na carne poderia sugerir um preocupante defeito, um vício ou um pecado”, afirmou o sacerdote. “Mas, pelo que de Paulo conhecemos, no contexto em que estamos, e pela sua forte característica judaica, o espinho na carne tem a ver com sua vida habitual”, afirma. “O que é a vida na carne? Ou a encarnação?” – pergunta o teólogo. “É a vida desde a concepção até a última respiração. Todos nós estamos na carne, na maneira judaica de pensar. Na maneira grega, seria uma vida devassa, depravada. Mas, na maneira judaica, é a vida humana, com suas limitações e suas possibilidades de êxito”, explica. “Ora, assim, o mais provável é que o espinho seja o temperamento impetuoso e impaciente de Paulo. Isso causou muito sofrimento a ele”.
De acordo com o teólogo, outra possibilidade do espinho na carne poderia ser o sofrimento de Paulo em ver sua gente recusar Jesus. “Ele dedica três capítulos, 9, 10 e 11 da Carta aos Romanos, a esse grande problema. É porque essa era uma grande preocupação sua”.
Segundo o sacerdote, há estudiosos que afirmam que o espinho na carne poderia ser alguma doença que causava desconforto ao apóstolo, como, por exemplo, um problema na vista.
“Mas parece mais provável que seja o temperamento. Na segunda Carta aos Coríntios, há um retrato disso. Paulo começa a falar, fica nervoso, aí pede desculpas, e depois lembra que também eles têm culpa. Então é mais provável que seja isso”, afirma.

Kátia Maria Bouez Azzi

 Deus te abençoes!
Pe. Luiz Gilderlane.

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